segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007



Orquídea

Minha pele se rasga da nuca ao cóccix
Dando liberdade a uma gigantesca lâmina
De cartilagem e penugem.
Meu peito se rasga
E dele sai em vôo tumultuando
Um enxame de vespas
Que zunem, zunem, zunem
Minhas veias ultrapassam o limite
Das pernas e se tornam raízes grossas
E firmes, que me prendem ao solo.
Nesse momento, meu tronco se solta
E alço vôo, com meus braços que já viraram asas
Do alto observo o bailar das nuvens
E o gorjeio dos automóveis
As penas das asas se soltam
Uma a umaTransformando-se em pétalas de orquídea
Que caem docemente pelo chão.


Texto Por Priscila de Andrade
Imagem Moscoso.

domingo, 18 de fevereiro de 2007




O vilarejo dos oráculos não estava lá muito melhor.

Haviam lhe dito que , ao procurar por um bom oráculo, o ideal era encontrar o oráculo que os outros oráculos frequentavam, mas ele estava fechado. "Nao sei mais de nada, tente aí ao lado - mas isso é uma sugestão, não um conselho formal de oráculo"

"Aí ao lado" era uma caverna a alguns metros. Fumaça e vapor subiam, de uma pequena fogueira e de uma panela de lata desgastada pendurada acima da fogueira. Saía um cheiro insuportável da panela, ou pelo menos deduzia-se isso. As bexigas dilatadas de algumas criaturas locais semalhantes a bodes estavam penduradas em um varal, secando ao sol, e o cheiro podia estar vindo dali. Havia também, preocupantemente próxima, uma pilha dos corpos descartados de criaturas semelhantes a bodes, e o cheiro poderia estar vindo dali.

Mas o cheiro também poderia tranquilamente estar vindo da senhora que estava ocupada espantando as moscas da pilha de corpos. Era do tamanho de uma tampinha de garrafa, com asas, e ela só tinha uma raquete de tênis de mesa. Parecia também ser meio cega. De vez em quando, por acaso, uma das suas pancadas enlouquecidas acertava uma das moscar com um safanão altamente satisfatório e a mosca zunia pelo ar, indo se estraçalhar na parede de rocha próxima á entrada da carverna.

Ela dava a impressão, pelo seu comportamento, de que sua vida girava em torno de momentos como aquele.

Assistiu áquela performance exótica por um tempo, mantendo uma distância educada, e depois finalmente tentou tossir discretamente para chamar a atençao da mulher. A tosse discreta em tom cortês infelizmente obrigou-o a inalar mais ar local do que havia feito antes até então e, por causa disso, ele teve um acesso de expectoraçao estridente e caiu de encontro á roca, engasgado e com o rosto coberto de lágrimas. Lutou para respirar, mas cada vez que inalava, a situação ficava pior. Vomitou, engasgou novamente, rolou sobre o próprio vomito, e finalmente, conseguiu ficar de quatro e se arrastou ofegante em direção a um ar um pouquinho mais fresco.

- Com lisença, Sinto muito, muitíssimo mesmo. Estou me sentindo um completa idiota e.. -

Apontou constrangido para pequena poça de seu próprio vomito espalha na entrada da caverna.- O que posso dizer? o que posso dizer numa situação como essa?

Aquilo, pelo menos, chamou a atenção da mulher. ela virou-se para ele, desconfiada, mas , por ser meio cega, teve uma certa dificuldade de distingui-lo na paisagem embaçada e rochosa.

Ele acenou, para ajudar.

- Olá! - disse ele

Finalmente ela o localizou, rosnou entre os dentes e voltou a dar pancadas nas moscas.
Estava terrivelmente aparente, julgando pela oscilação das correntes de arconforme ela se mexia, que a principal fonte de fedor era ela. As bexigas no varal, os corpos pestilentos e a sopa insalubre certamente contribuíam violentamente para a atmosfera geral, mas a principal fonte olfativa era a mulher em si.
Acertou outra pancada em uma das moscas. ela se despedaçou contra a rocha e esvaiu-se em um filete liquido.
Vacilante, ele ficou de pé e se limpou com um punhado de grama seca. Não sabia mais o que fazer para anunciar sua presença. Chegou a pensar em ir embora de fininho, mas não achou de bom tom deixar um motinho de vomito na frente da casa dela. pensou no que podia fazer a respeito. começou a colher mais punhados da grama seca aqui e ali. Mas estava com medo de se aproximar do vomito e , em vez de limpar, aumentar mais a poça.

Art by Robert Venosa with Steven Miller
Texto por Douglas Adams

*** ouvindo Frank Zappa - Dont eat the yellow snow

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Iniciando aqui

Sim, temos sempre que começar novamente.
Nunca paramos de iniciar.
O fim nunca chega,
a morte é apenas o inicio de um novo ciclo.
Não existimos, apenas vivemos,
e está sempre acontecendo.

Então, começo aqui com um texto do Claudio Willer
retirado do seu livro Estranhas experiências,
poeta e ensaísta Brasileiro.



Anotações de viagem

1

MEIO-DIA

a Terra respira
formigas transitam por suas nervuras
arabesco de pássaros
pontuam o pausado discurso das nuvens
só existe o espaço
a paisagem lacustre
que agora cobre una cidade submersa
e sem saber por que vim parar aqui
o que me trouxe a esta fronteira de lugares e sensações
entro n'água
a claridade me leva á deriva
flutuo no amploe
mbebido no dia mais que morno
sei-me hóspede de quem tenho sido
(a surpefície do lago
se desmancha no movimento dos círculos concênctricos)